A temperatura das explosões solares ajuda a entender a natureza do plasma solar

Explosão solar

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A rotação do Sol produz mudanças em seu campo magnético, que muda completamente a cada 11 anos, desencadeando uma fase de intensa atividade.

Explosões solares – enormes erupções da superfície do Sol que duram minutos ou horas – emitem intensas rajadas de partículas e altos níveis de radiação eletromagnética. A liberação de energia durante as explosões solares aquece a cromosfera, causando a ionização quase total do hidrogênio atômico presente na região.

A cromosfera é uma fina camada de plasma que fica pelo menos 2.000 km acima da superfície visível do Sol (a fotosfera) e abaixo da coroa (a atmosfera superior do Sol). O plasma é muito denso e o hidrogênio se recombina em uma taxa muito alta, resultando em um processo recorrente de ionização e recombinação de hidrogênio que produz um tipo característico de emissão de radiação na faixa ultravioleta conhecida como Lyman Continuum (LyC) em memória do americano físico Theodore Lyman IV (1874-1954).

Descrições teóricas sugerem que a “temperatura de cor” do LyC pode estar associada à temperatura do plasma que produz a erupção e, portanto, a temperatura de cor pode ser usada para determinar a temperatura do plasma durante as tempestades solares.

Um novo estudo simulou emissões de dezenas de explosões solares diferentes e confirmou a ligação entre a temperatura de cor do LyC e a temperatura do plasma na região de onde a explosão ocorre. Também confirma que um equilíbrio termodinâmico local ocorre na região entre o plasma e os fótons no LyC. Um artigo sobre o estudo foi publicado no The Astrophysical Journal. O estudo foi financiado pela FAPESP.

O penúltimo autor do artigo é Paulo José de Aguiar Simões, professor da Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana Mackenzie (EE-UPM), no estado de São Paulo, Brasil. “Mostramos que a intensidade do LyC aumenta significativamente durante as erupções solares e que a análise do espectro de Lyman realmente pode ser usada para o diagnóstico do plasma”, disse Simões, que também é pesquisador do Centro Mackenzie de Radioastronomia e Astrofísica (CRAAM).

As simulações corroboraram um importante resultado obtido no Laboratório de Dinâmica Solar pelo astrônomo argentino Marcos Machado mostrando que a temperatura de cor, que em períodos de silêncio fica na casa dos 9.000 Kelvin (K), sobe para 12.000-16.000 K durante as explosões. O artigo em que relatou esse resultado e do qual Simões também foi coautor, foi o último publicado por Machado. Um especialista de renome mundial no Sol, ele morreu em 2018 enquanto o artigo estava sendo revisado por pares.

Dinâmica solar

Aqui vale relembrar um pouco do que se sabe sobre a estrutura e dinâmica do Sol. A enorme quantidade de energia que fornece à Terra luz e calor é gerada principalmente pela conversão de hidrogênio em hélio em um processo de fusão nuclear que ocorre no interior da estrela. Essa vasta região não é diretamente observável porque a luz não atravessa a “superfície” do Sol, que na verdade é a fotosfera.

“Podemos observar diretamente a região acima da superfície. A primeira camada, que se estende até uma altitude de cerca de 500 km, é a fotosfera, com temperatura em torno de 5.800 K. É nela que vemos as manchas solares, em locais onde os campos magnéticos que emergem do Sol inibem a convecção e mantêm a plasma relativamente frio, produzindo essas áreas mais escuras que chamamos de manchas solares”, explicou Simões.

Acima da fotosfera, a cromosfera se estende por cerca de 2.000 km. “A temperatura dessa camada é maior, ultrapassando 10.000 K, e o plasma é menos denso. Devido a essas características, o hidrogênio atômico é parcialmente ionizado, mantendo prótons e elétrons separados”, disse ele.

Em uma fina camada de transição no topo da cromosfera, a temperatura sobe acentuadamente para mais de 1 milhão de K e a densidade do plasma cai em muitas ordens de magnitude. Esse aquecimento repentino na passagem da cromosfera para a coroa é um fenômeno contra-intuitivo; seria razoável esperar que a temperatura caísse à medida que a distância da fonte aumentasse.

“Ainda não temos uma explicação. Várias propostas foram apresentadas por físicos solares, mas nenhuma foi aceita sem reservas pela comunidade”, disse Simões.

A coroa se estende em direção ao meio interplanetário, sem uma região de transição bem definida. Os campos magnéticos do Sol exercem forte influência sobre a coroa, estruturando o plasma, principalmente em regiões ativas facilmente identificadas em imagens ultravioleta como a que ilustra a característica correspondente (https://agencia.fapesp.br/41378) na Agência FAPESP. Explosões solares ocorrem nessas regiões ativas.

“Nessas tempestades solares, a energia acumulada nos campos magnéticos coronais é liberada abruptamente, aquecendo o plasma e acelerando as partículas. Os elétrons, que têm menos massa, podem ser acelerados até 30% da velocidade da luz. Algumas dessas partículas, que viajam ao longo de linhas magnéticas de força, são ejetadas no meio interplanetário. Outros vão na direção oposta, da coroa para a cromosfera, onde colidem com o plasma de alta densidade e transferem sua energia para o meio. Essa energia excedente aquece o plasma local, causando ionização dos átomos. A dinâmica de ionização e recombinação dá origem ao Lyman Continuum”, disse Simões.

Os picos de atividade solar ocorrem aproximadamente a cada 11 anos. Durante os períodos de intensa atividade, os efeitos na Terra são substanciais, incluindo mais exibições de auroras boreais, apagões de comunicações de rádio, efeitos intensificados de cintilação em sinais de GPS e um aumento no arrasto dos satélites, reduzindo sua velocidade e, portanto, a altitude de seus satélites. órbitas. Esses fenômenos e as propriedades físicas do meio interplanetário próximo à Terra são conhecidos como clima espacial.

“Além do conhecimento fundamental que fornecem, os estudos da física das erupções solares também melhoram nossa capacidade de prever o clima espacial. Esses estudos caminham sobre duas pernas: observação direta e simulações baseadas em modelos computacionais. Dados observacionais nas diferentes bandas do espectro eletromagnético permitem entender melhor a evolução das erupções solares e as propriedades físicas do plasma envolvido nesses eventos. Modelos computacionais, como os utilizados no nosso estudo, servem para testar hipóteses e verificar interpretações das observações, uma vez que nos dão acesso a quantidades que não podem ser obtidas diretamente a partir da análise de dados observacionais”, disse Simões.


Publicado em 28/05/2023 19h51

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