Partículas de alta energia que bombardeiam a Terra das profundezas do espaço podem se originar de blazares, sugere uma nova pesquisa.
Novas pesquisas revelaram que os neutrinos de alta energia e os raios cósmicos que bombardeiam a Terra a partir do espaço profundo se originam em blazares – núcleos ativamente galácticos (AGN) que se escondem no centro das galáxias e são alimentados por buracos negros supermassivos.
Os pesquisadores sabem que os raios cósmicos são partículas carregadas do espaço profundo que atingem continuamente a Terra com energias de até 1020 elétron-volts – um milhão de vezes mais energéticas do que as energias geradas no Grande Colisor de Hádrons (LHC). O que poderia lançar essas partículas com tanta força que elas viajam bilhões de anos-luz, no entanto, permanece um mistério.
Isso ocorre porque os raios cósmicos consistem em partículas eletricamente carregadas, o que significa que, à medida que viajam bilhões de anos-luz de sua fonte para a Terra, eles são repetidamente desviados pelos campos magnéticos das galáxias, tornando suas fontes impossíveis de detectar.
Alguns dos processos e eventos que lançam raios cósmicos também explodem neutrinos astrofísicos, e essas partículas “fantasmas” podem ser usadas como “mensageiras” para resolver esse quebra-cabeça, acredita uma equipe de astrofísicos.
“Os neutrinos astrofísicos são produzidos exclusivamente em processos que envolvem a aceleração de raios cósmicos”, disse Sara Buson, membro da equipe e professora de astrofísica da Julius-Maximilians-Universität (JMU) Würzburg, Sara Buson em um comunicado.
Os neutrinos são partículas sem carga e com muito pouca massa que interagem com a matéria tão fracamente que passam por galáxias, planetas e até pelo corpo humano quase sem deixar vestígios. Por não terem carga, os neutrinos não sofrem as mesmas deflexões que os raios cósmicos, o que significa que suas fontes podem ser identificadas com mais precisão.
Em 2017, foi detectado um sinal de neutrino que pode ser rastreado até o blazar TXS 0506+056. Como resultado, Buson sugeriu que os blazares – que emitem mais radiação do que toda a população estelar das galáxias ao seu redor – são responsáveis por explodir neutrinos de alta energia.
Em 2021, ela e sua equipe começaram a solidificar essa conexão com um projeto de astronomia multi-mensageiro, que mistura astronomia ‘tradicional’ com observações de neutrinos. Esses novos resultados foram alcançados usando dados do Observatório de Neutrinos IceCube – o detector de neutrinos mais sensível já criado – localizado nas profundezas do gelo do pólo sul na Antártida.
A equipe usou esses dados para confirmar que a localização dos blazares correspondia à direção dos neutrinos astrofísicos com frequência suficiente para que essa associação não pudesse ser atribuída apenas ao acaso, fornecendo a primeira evidência sólida da conexão entre neutrinos astrofísicos e blazares.
“Depois de rolar os dados várias vezes, descobrimos que a associação aleatória só pode exceder a dos dados reais uma vez em um milhão de tentativas”, disse Andrea Tramacere, membro da equipe e cientista do departamento de astronomia da Universidade de Genebra. “Esta é uma forte evidência de que nossas associações estão corretas.”
E como esses neutrinos são criados em locais onde os raios cósmicos são acelerados e lançados, isso indica que os blazares também são responsáveis por acelerar os raios cósmicos. Isso pode ser o resultado de como o buraco negro supermassivo no coração de um blazar ‘mastiga’ matéria como gás e poeira que os cerca antes de ser ‘alimentado’ – ou agregado – à sua superfície.
Buracos negros giratórios que arrastam o próprio tecido do espaço-tempo junto com eles, um efeito chamado de arrastamento de quadros ou precessão de Lense-Thirring, garante que a matéria ao seu redor não fique parada, o que facilita a aceleração das partículas.
“O processo de acreção e a rotação do buraco negro levam à formação de jatos relativísticos, onde as partículas são aceleradas e emitem radiação até energias de mil bilhões [de vezes maiores que] a da luz visível”, explicou Tramacere. “A descoberta da conexão entre esses objetos e os raios cósmicos pode ser a ‘pedra de Roseta’ da astrofísica de alta energia.”
Segundo Tramacere, o próximo passo desta pesquisa é investigar a diferença entre os tipos de blazares que emitem neutrinos e os que não emitem.
“Isso nos ajudará a entender até que ponto o ambiente e o acelerador ‘conversam’ entre si”, disse o cientista da Universidade de Genebra. “Então poderemos descartar alguns modelos, melhorar o poder preditivo de outros e, finalmente, adicionar mais peças ao eterno quebra-cabeça da aceleração dos raios cósmicos”.
Publicado em 30/07/2022 14h41
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