O sono do polvo inclui um estágio frenético, colorido e ´ativo´

Durante uma breve sessão de sono ativo, este polvo no laboratório fica vermelho escuro.

Os polvos passam por dois estágios de sono, relata um novo estudo.

Primeiro vem um sono tranquilo e, em seguida, uma mudança para um sono agitado e ativo em que cores vibrantes piscam na pele dos animais. Esses detalhes, colhidos de quatro cefalópodes cochilando em um laboratório no Brasil, podem fornecer pistas para um grande mistério científico: por que os animais dormem?

O sono é tão importante que cada animal parece ter uma versão dele, diz Philippe Mourrain, neurobiologista da Universidade de Stanford que recentemente descreveu os estágios do sono dos peixes. Os cientistas também catalogaram o sono em répteis, pássaros, anfíbios, abelhas, mamíferos e águas-vivas, para citar alguns. “Até agora, não encontramos uma única espécie que não dorme”, disse Mourrain, que não participou do novo estudo.

A neurocientista cefalópode e mergulhadora Sylvia Medeiros pegou quatro polvos selvagens, Octopus insularis, e os trouxe temporariamente para um laboratório no Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte em Natal, Brasil. Depois de colocar os animais em uma área tranquila, ela começou a registrar cuidadosamente o comportamento deles durante o dia, quando os polvos estão mais propensos a descansar.

Dois estados distintos surgiram, ela e seus colegas relatam 25 de março na iScience. No primeiro, chamado de sono tranquilo, os polvos são pálidos e imóveis com as pupilas dos olhos estreitadas em fendas. O sono ativo vem a seguir. Os olhos se movem rapidamente, as ventosas se contraem, os músculos se contraem, as texturas da pele mudam e, de forma mais dramática, cores brilhantes percorrem os corpos dos polvos. Esse sono selvagem é rítmico, acontecendo a cada meia hora mais ou menos, e breve; acaba depois de cerca de 40 segundos. O sono ativo também é raro; os polvos passam menos de 1% dos dias em sono ativo, descobriram os pesquisadores.

O sono ativo em polvos é mais ou menos como o sono REM nas pessoas, diz Medeiros. Mas, como o sono ativo dos polvos é tão curto, seus ciclos de sono se assemelham mais ao sono de répteis e pássaros, diz o co-autor do estudo Sidarta Ribeiro, neurocientista também do Instituto do Cérebro.

No meio de um estado de hibernação ativo, um a pele do polvo muda de cor e textura. Olhos em movimento, músculos contraídos e ventosas contraídas também marcam essa fase semelhante ao REM.


Os resultados são consistentes com o trabalho recente sobre o choco adormecido, outro cefalópode, diz a neuroetologista Teresa Iglesias, do Instituto de Ciência e Tecnologia de Okinawa, no Japão. ?Estou emocionada com o progresso e o interesse na pesquisa do sono dos cefalópodes?, diz ela.

Nas pessoas, acredita-se que o sono permite que o cérebro se organize, livrando-se de informações inúteis e fortalecendo memórias úteis. ?Imediatamente vem à mente que o polvo é muito esperto?, diz Ribeiro. Talvez um processo de classificação semelhante aconteça no cérebro do polvo adormecido, diz ele.

Para as pessoas, o sono REM está repleto de sonhos. ?É tentador tentar ler os sonhos dos polvos na pele?, diz Ribeiro. Mas por mais divertido que seja especular, ninguém sabe o que os polvos experimentam durante essas sessões ativas de cores vibrantes e cintilantes. Os pesquisadores têm muito mais trabalho a fazer antes de dizer que os polvos sonham, diz Ribeiro. E mesmo que isso aconteça, esses sonhos podem não fazer muito sentido para um humano.


Publicado em 28/03/2021 14h34

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