Inteligência Artificial ajuda cientistas a escutar golfinhos cor-de-rosa ameaçados

Os botos usam cliques e assobios para se comunicarem e encontrarem suas presas. Crédito: Sylvain Cordier/Gamma-Rapho via Getty

#Golfinho 

A tecnologia de rastreamento acústico pode alimentar projetos de conservação na Amazônia e além.

Pesquisadores usaram inteligência artificial (IA) para mapear os movimentos de duas espécies ameaçadas de golfinhos no rio Amazonas, treinando uma rede neural para reconhecer os cliques e assobios únicos dos animais.

As descobertas, publicadas no Scientific Reports em 27 de julho, podem levar a melhores estratégias de conservação, ajudando os pesquisadores construindo uma imagem precisa dos movimentos dos golfinhos em uma vasta área de floresta tropical que fica submersa a cada ano após a estação chuvosa.

O uso do som é muito menos invasivo do que as técnicas de rastreamento convencionais, como o uso de etiquetas GPS, barcos ou drones aéreos.

“O som é provavelmente o único sentido que conhecemos e que todos compartilhamos na Terra”, diz o coautor Michel André, bioacústico da Universidade Técnica da Catalunha em Barcelona, Espanha.

André e seus colegas queriam explorar a atividade de duas espécies, o boto (Inia geoffrensis) – também conhecido como boto-cor-de-rosa – e o tucuxi (Sotalia fluviatilis) nas várzeas da reserva Mamirauá, no norte do Brasil. Os pesquisadores colocaram microfones subaquáticos em vários locais para escutar o paradeiro dos animais.

Para distinguir os sons dos golfinhos da paisagem sonora barulhenta da Amazônia, eles recorreram à IA, alimentando as gravações em uma rede neural de deep learning capaz de categorizar sons em tempo real, “exatamente como fazemos com nosso próprio cérebro”, diz André.

Com essa tecnologia, os pesquisadores podem analisar volumes de informação “que de outra forma seriam quase impossíveis”, diz Federico Mosquera-Guerra, que estuda os golfinhos da Amazônia na Universidade Nacional da Colômbia, em Bogotá.

A IA foi treinada para identificar três tipos de som: golfinhos, chuva e motores de barco. Ambas as espécies de golfinhos usam cliques de ecolocalização quase constantemente para sentir seu ambiente e se comunicam com os outros assobiando. A detecção desses cliques e assobios permitiu que os pesquisadores mapeassem os movimentos dos animais. Botos e tucuxis têm assobios distintos, então a rede neural poderia distinguir entre as espécies.

Esforços de conservação

O estudo faz parte de uma colaboração entre a Universidade Técnica da Catalunha e o Instituto Mamirauá de Desenvolvimento Sustentável em Tefé, Brasil, que visa usar essa tecnologia para monitorar a biodiversidade da Amazônia e as ameaças a ela.

Ambas as espécies de golfinhos estão ameaçadas de extinção: estimativas sugerem que a população de botos está diminuindo 50% a cada dez anos, e a população de tucuxi a cada nove anos. Monitorar quando e onde os animais se movem permitirá aos pesquisadores ajudar a proteger suas populações e propor medidas para ajudar “as comunidades indígenas a conviver com a presença de golfinhos”, diz André. Os golfinhos podem atrapalhar a pesca nas planícies aluviais, por exemplo, competindo por peixes ou se enredando em redes.

Mosquera-Guerra diz que coletar essas informações é “fundamental” para informar as decisões sobre conservação em toda a região amazônica.

No futuro, a equipe quer treinar a rede neural para detectar outras espécies aquáticas e implantar o sistema em uma área mais ampla. A mesma abordagem também pode ser usada no oceano. O trabalho anterior de André usando este sistema mostrou os efeitos da poluição sonora produzida pelo homem em cachalotes e permitiu o desenvolvimento de um sistema de alerta para navios para ajudar a evitar os animais.


Publicado em 04/08/2023 12h45

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