doi.org/10.1038/s41586-024-07893-0
Credibilidade: 989
#Tempestade
Tempestades criam ventos fortes, chuva e raios, mas muitos não sabem que elas também produzem um subproduto comum: radiação gama. Graças a uma adaptação criativa de um antigo avião espião U-2 da NASA, pesquisadores finalmente puderam analisar diretamente esses microexplosões de energia radioativa que ocorrem diariamente no planeta. Descobertas recentes, publicadas em 3 de outubro na revista *Nature*, mostram que tempestades radioativas são muito mais frequentes do que se pensava.
“Há muito mais acontecendo nas tempestades do que imaginávamos.”
Na década de 1990, cientistas detectaram acidentalmente raios gama em tempestades quando satélites da NASA, projetados para estudar supernovas e outros corpos cósmicos, registraram sinais desses fenômenos logo abaixo de onde estavam. Desde então, os pesquisadores usaram esses satélites, embora não fossem ajustados especificamente para observar relâmpagos.
Com o tempo, a compreensão sobre a geração dessa radiação começou tomando forma. À medida que as tempestades se formam, correntes de ar carregam gotas de água, gelo e granizo, criando cargas elétricas, como a eletricidade estática. Ions carregados positivamente movem-se para o topo da tempestade, enquanto os negativos descem, formando um campo elétrico comparável à energia de 100 milhões de pilhas AA. Partículas energizadas, como elétrons, aceleram nesse campo, às vezes com tanta velocidade que derrubam outros elétrons das moléculas de ar, gerando explosões rápidas de raios gama e outras partículas radioativas.
Essa radiação gama é tão comum que pilotos já relataram ver um brilho fraco dentro de nuvens de tempestades. Contudo, fatores desconhecidos parecem impedir que essas explosões causem reações maiores.
“Algumas campanhas com aeronaves tentaram verificar se esses fenômenos eram comuns, mas os resultados foram variados, e algumas campanhas nos EUA não encontraram radiação gama”, disse Steve Cummer, professor de engenharia da Universidade Duke e coautor de ambos os estudos publicados.
Após anos de estudos indiretos, a NASA ofereceu a Cummer e sua equipe um avião espião U-2 modificado, agora chamado de ER-2, perfeito para observar tempestades a altitudes de até 22.000 metros, viajando a 765 km/h. Com os instrumentos certos a bordo, os pesquisadores esperavam que o ER-2 solucionasse a questão de uma vez por todas.
Os resultados surpreenderam a equipe
“Há muito mais acontecendo nas tempestades do que imaginávamos”, explicou Cummer. “Praticamente todas as grandes tempestades geram raios gama o tempo todo e de várias formas.”
Em um mês, 10 voos foram realizados sobre tempestades no sul da Flórida, e 9 delas continham o “brilho” de radiação gama, muito mais dinâmico do que os pesquisadores imaginavam.
“O padrão lembra uma enorme panela fervendo, brilhando em raios gama”, disse o professor de física Martino Marisaldi, coautor do estudo.
Muitas dessas observações coincidem com as vistas por satélites da NASA há 30 anos, quase sempre junto com raios. Isso sugere que os relâmpagos são um dos principais responsáveis pela geração de raios gama, ao supercarregar os elétrons energizados do campo elétrico. No entanto, novas descobertas também foram registradas.
A equipe identificou pelo menos dois novos tipos de explosões curtas de raios gama: uma que dura menos de um milésimo de segundo e outra com cerca de 10 explosões ao longo de um décimo de segundo. Para Cummer, essas são as descobertas “mais interessantes”.
“Essas explosões parecem surgir espontaneamente, sem estar ligadas a raios”, ele explicou, sugerindo que essas explosões de raios gama podem estar ligadas a processos das tempestades que iniciam os raios. No entanto, ele admite que esses processos ainda são um mistério.
Mais respostas podem surgir com novos voos do ER-2 sobre tempestades carregadas de raios gama. Até lá, Cummer garante que não há motivo para preocupação com essas “panelas ferventes” de radiação acima de nossas cabeças.
“A radiação seria o menor dos seus problemas se você estivesse em uma tempestade dessas”, brincou Cummer.
Publicado em 08/10/2024 00h42
Artigo original: