Descoberta sem precedentes: astrônomos descobrem diferenças primordiais em estrelas binárias

A impressão deste artista ilustra um par binário de estrelas gigantes. Apesar de nascerem da mesma nuvem molecular, os astrônomos detectam frequentemente diferenças nas composições químicas e nos sistemas planetários das estrelas binárias. Uma estrela neste sistema hospeda três pequenos planetas rochosos, enquanto a outra estrela hospeda dois gigantes gasosos. Usando o GHOST da Gemini South, uma equipe de astrônomos confirmou pela primeira vez que estas diferenças podem ser atribuídas a heterogeneidades na nuvem molecular primordial a partir da qual as estrelas nasceram. Crédito: NOIRLab/NSF/AURA/J. da Silva (Motor Espacial)/M. Zamani

doi.org/10.1051/0004-6361/202449263
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#Estrelas Binárias 

Astrônomos verificaram que variações na composição química de estrelas binárias têm origem nas fases iniciais de sua formação

Uma pesquisa recente utilizando o telescópio Gemini South mostrou que as diferenças nas composições químicas de estrelas binárias são devidas a condições primordiais nas suas nuvens de nascimento, desafiando teorias anteriores e sugerindo um processo mais complexo de formação de estrelas e planetas.

Estima-se que até 85% das estrelas existam em sistemas binários, algumas até em sistemas contendo três ou mais estrelas.

Estes pares estelares nascem juntos a partir da mesma nuvem molecular, partilhando uma abundância de blocos de construção químicos.

Assim, os astrônomos esperariam que eles tivessem composições e sistemas planetários quase idênticos.

No entanto, nem sempre é esse o caso.

Embora algumas explicações sugiram que estas diferenças surgem de eventos que ocorrem após a evolução das estrelas, uma equipe de astrônomos confirmou pela primeira vez que estas diferenças podem realmente ter origem antes mesmo de as estrelas começarem formando-se.

Liderada por Carlos Saffe do Instituto de Ciências Astronômicas, da Terra e do Espaço (ICATE-CONICET) na Argentina, a equipe usou o telescópio Gemini Sul no Chile, metade do Observatório Internacional Gemini, apoiado em parte pela Fundação Nacional de Ciência dos EUA e operado pela NSF NOIRLab.

Com o novo e preciso Espectrógrafo Óptico de Alta Resolução Gemini (GHOST), a equipe estudou os diferentes comprimentos de onda da luz, ou espectros, emitidos por um par de estrelas gigantes, que revelaram diferenças significativas na sua composição química.

Os espectros de qualidade extremamente elevada do GHOST ofereceram uma resolução sem precedentes,- disse Saffe, permitindo-nos medir os parâmetros estelares e as abundâncias químicas das estrelas com a maior precisão possível.- Estas medições revelaram que uma estrela tinha maior abundância de elementos pesados do que a outra.

Para desvendar a origem desta discrepância, a equipe utilizou uma abordagem única.

Explorando as teorias por trás das variações de composição Estudos anteriores propuseram três explicações possíveis para as diferenças químicas observadas entre estrelas binárias.

Dois deles envolvem processos que ocorreriam durante a evolução das estrelas: difusão atômica, ou a fixação de elementos químicos em camadas gradientes dependendo da temperatura e da gravidade superficial de cada estrela; e o engolfamento de um planeta pequeno e rochoso, o que introduziria variações químicas na composição de uma estrela.

A terceira explicação possível remonta ao início da formação das estrelas, sugerindo que as diferenças se originam de áreas primordiais, ou pré-existentes, de não uniformidade dentro da nuvem molecular.

Em termos mais simples, se a nuvem molecular tiver uma distribuição desigual de elementos químicos, então as estrelas nascidas dentro dessa nuvem terão composições diferentes dependendo de quais elementos estavam disponíveis no local onde cada uma se formou.

Até agora, os estudos concluíram que todas as três explicações são prováveis; no entanto, esses estudos focaram apenas em binários de sequência principal.

A “sequência principal? é o estágio onde uma estrela passa a maior parte de sua existência, e a maioria das estrelas no Universo são estrelas da sequência principal, incluindo o nosso Sol.

Em vez disso, Saffe e a sua equipe observaram um binário composto por duas estrelas gigantes.

Essas estrelas possuem camadas externas extremamente profundas e fortemente turbulentas, ou zonas convectivas.

Devido às propriedades destas zonas convectivas espessas, a equipe conseguiu descartar duas das três explicações possíveis.

Zonas Convectivas e Teorias de Eliminação O turbilhão contínuo de fluido dentro da zona convectiva tornaria difícil para o material se estabelecer em camadas, o que significa que estrelas gigantes são menos sensíveis aos efeitos da difusão atômica, descartando a primeira explicação.

A espessa camada externa também significa que um engolfamento planetário não mudaria muito a composição de uma estrela, uma vez que o material ingerido seria rapidamente diluído, descartando a segunda explicação.

Isto deixa heterogeneidades primordiais dentro da nuvem molecular como explicação confirmada.

Esta é a primeira vez que os astrônomos conseguem confirmar que as diferenças entre estrelas binárias começam nas fases iniciais da sua formação,- disse Saffe.

Utilizando as capacidades de medição de precisão fornecidas pelo instrumento GHOST, a Gemini South está agora a recolher observações de estrelas no final das suas vidas para revelar o ambiente em que nasceram,- diz Martin Still, diretor do programa NSF para o Observatório Internacional Gemini.

Isto dá-nos a capacidade de explorar como as condições em que as estrelas se formam podem influenciar toda a sua existência ao longo de milhões ou bilhões de anos.

– Três consequências deste estudo são de particular importância

Primeiro, estes resultados oferecem uma explicação para a razão pela qual os astrônomos vêem estrelas binárias com sistemas planetários tão diferentes.

Diferentes sistemas planetários podem significar planetas muito diferentes, rochosos, semelhantes à Terra, gigantes de gelo, gigantes gasosos que orbitam as suas estrelas hospedeiras a distâncias diferentes e onde o potencial para suportar vida pode ser muito diferente,- disse Saffe.

Em segundo lugar, estes resultados representam um desafio crucial ao conceito de marcação química utilizando composição química para identificar estrelas que vieram do mesmo ambiente ou berçário estelar, mostrando que estrelas com composições químicas diferentes ainda podem ter a mesma origem.

Finalmente, as diferenças observadas anteriormente atribuídas a impactos planetários na superfície de uma estrela terão de ser revistas, uma vez que podem agora ser vistas como estando presentes desde o início da vida da estrela.

Ao mostrar pela primeira vez que diferenças primordiais estão realmente presentes e são responsáveis pelas diferenças entre estrelas gémeas, mostramos que a formação de estrelas e planetas pode ser mais complexa do que se pensava inicialmente,- disse Saffe.

O Universo adora a diversidade!-


Publicado em 23/07/2024 09h02

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