Cientistas detectam ligação genética entre resultados de exames de sangue e alguns transtornos mentais

(Science Photo/Shutterstock)

Distúrbios de saúde mental, incluindo depressão, esquizofrenia e anorexia, mostram ligações com marcadores biológicos detectados em exames de sangue de rotina, de acordo com nosso novo estudo de dados genéticos, bioquímicos e psiquiátricos de quase um milhão de pessoas.

A pesquisa aumentará nossa compreensão do que causa a doença mental e pode ajudar a identificar novos tratamentos.

Corpo são, mente sã

As pessoas geralmente consideram a saúde mental separada da saúde do resto do corpo. Isso está longe de ser verdade: há evidências claras de que muitas substâncias bioquímicas envolvidas em doenças como diabetes e doenças autoimunes afetam diretamente a função do nosso cérebro.

Muitos estudos tentaram resolver isso concentrando-se em substâncias chamadas biomarcadores que podem ser prontamente medidas no sangue.

Um biomarcador é simplesmente algo no corpo que é um sinal de uma doença ou processo específico. Isso geralmente está relacionado ao tipo de coisas relatadas em um exame de sangue solicitado pelo seu médico, como colesterol, açúcar no sangue, enzimas hepáticas, vitaminas ou marcadores de inflamação.

Os biomarcadores encontrados em exames de sangue de rotina são úteis, pois muitas vezes são afetados pela dieta e estilo de vida, ou pelo tratamento com um medicamento.

O complexo papel da genética na saúde mental

Muitas vezes é difícil estudar o papel desses biomarcadores sanguíneos nas condições de saúde mental. Muitos estudos nesta área muitas vezes não são grandes o suficiente para tirar conclusões fortes.

Uma solução é examinar as influências genéticas tanto nas doenças mentais quanto nas substâncias medidas no sangue. A genética é útil, pois agora temos dados de milhões de indivíduos que se voluntariaram em estudos de pesquisa.

Tanto as doenças mentais quanto os biomarcadores sanguíneos são o que os geneticistas chamam de “traços complexos”. Em características complexas, muitos genes estão envolvidos e fatores ambientais também contribuem.

A ampla disponibilidade de dados genéticos nos permitiu investigar como um grande número de pequenas mudanças na sequência de DNA (ou “variantes”) está relacionado ao risco de doença mental. Essas mesmas variantes também podem ser ligadas aos níveis medidos de um biomarcador no sangue.

Por exemplo, uma variante em um gene específico pode aumentar o risco de desenvolver esquizofrenia e também estar ligada a uma diminuição nos níveis de uma vitamina circulante no sangue.

A maioria dessas variantes está individualmente associada a mudanças muito pequenas em algo como risco de doença mental, mas podem se somar para produzir efeitos maiores.

Como os biomarcadores sanguíneos estão relacionados à doença mental?

Nosso estudo recente procurou usar a genética para investigar a relação entre nove transtornos de saúde mental e 50 fatores medidos em exames de sangue de rotina, como colesterol, vitaminas, enzimas e indicadores de inflamação.

Usamos dados de estudos muito grandes conduzidos por outras pessoas, com dados de quase um milhão de voluntários incluídos no total.

Nosso estudo primeiro confirmou a existência do que é chamado de correlação genética entre biomarcadores sanguíneos e doença mental, que foi mais difundida do que foi demonstrado anteriormente.

Correlação genética significa que o efeito das alterações na sequência de DNA no risco de uma doença mental e os níveis de um determinado biomarcador eram mais semelhantes entre si do que o que ocorreria por acaso.

Para dar um exemplo, houve uma correlação genética positiva em nosso estudo entre a contagem de glóbulos brancos e a depressão. Isso pode indicar que algum processo em nosso corpo influencia tanto a depressão quanto os glóbulos brancos.

Se pudéssemos identificar o que é esse processo compartilhado, isso poderia levar a uma melhor compreensão do que causa a depressão e isso poderia ser alvo de tratamento.

Correlação versus causalidade

Nosso estudo mostrou que havia correlação entre a genética da doença mental e fatores no sangue, mas isso não nos diz se os biomarcadores sanguíneos estão envolvidos no que causa a doença mental.

Para distinguir correlação de causalidade na medicina, a abordagem padrão-ouro é conduzir ensaios clínicos em que os pacientes recebem aleatoriamente um tratamento ou um placebo. No entanto, esses ensaios são caros e difíceis de conduzir.

Fizemos a próxima melhor coisa: usar variantes de DNA ligadas a alterações nos biomarcadores sanguíneos para atuar como um ensaio clínico natural. Esse processo tira vantagem do fato de que herdamos aleatoriamente variantes de DNA de nossos pais, da mesma forma que os participantes de um ensaio clínico recebem aleatoriamente um tratamento ou um placebo.

É um método complexo e os resultados precisam de uma interpretação cuidadosa.

Encontramos evidências de que algumas substâncias medidas no sangue podem realmente estar envolvidas na causa de algumas doenças mentais. Proteínas relacionadas ao sistema imunológico, por exemplo, podem estar envolvidas na depressão, esquizofrenia e anorexia.

Agora é necessário mais trabalho para identificar como essas medidas de sangue estão precisamente envolvidas nesses distúrbios e descobrir se elas podem ser direcionadas para tratamento.


Publicado em 10/04/2022 23h45

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