Finalmente temos uma ligação genética entre o câncer de ovário e a endometriose

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Os cientistas encontraram uma ligação genética e uma relação potencialmente causal entre a endometriose e alguns tipos de câncer de ovário.

O risco absoluto de uma paciente com endometriose desenvolver câncer ainda é muito baixo, mas esses marcadores genéticos sobrepostos podem ajudar os pesquisadores a entender e tratar melhor ambas as doenças no futuro.

“Não queremos que as mulheres com endometriose se preocupem, mas queremos que elas estejam cientes e saibam que o objetivo deste estudo foi aumentar nossa compreensão de ambas as doenças, entendendo o vínculo genético entre elas”, explica o biocientista molecular Sally Mortlock, da Universidade de Queensland, Austrália.

A endometriose é uma condição altamente comum e notoriamente subdiagnosticada. Ocorre quando células semelhantes ao revestimento do útero crescem em outras partes do corpo, às vezes causando dor ou infertilidade.

Semelhante a outras condições de dor feminina, a endometriose, ou ‘endo’, tem sido historicamente negligenciada pela medicina e, graças a esse revés, hoje ainda sabemos muito pouco sobre isso, incluindo como é causado.

Pesquisas recentes sugerem que o endo possui um forte componente genético, muitas vezes agrupando-se em famílias. Estudos epidemiológicos também mostraram que aqueles com endo são mais propensos a desenvolver câncer de ovário mais tarde na vida.

Para investigar ainda mais a relação entre essas duas condições, pesquisadores na Austrália reuniram dados de vários estudos de associação de todo o genoma.

No final, eles encontraram 19 localizações genéticas no DNA feminino que parecem predispor as pessoas à endo, ao mesmo tempo que as predispõem ao câncer de ovário epitelial (que é o tipo que se desenvolve no revestimento externo do ovário).

“No geral, os estudos estimam que 1 em 76 mulheres correm o risco de desenvolver câncer de ovário ao longo da vida, e ter endometriose aumenta isso ligeiramente para 1 em 55”, diz Mortlock.

Ainda não sabemos como prever quais pacientes endo têm maior probabilidade de desenvolver câncer de ovário, mas a pesquisa recente de Mortlock nos dá algumas pistas.

O estudo utilizou dados genômicos de várias metanálises grandes e recentes sobre endometriose e câncer epitelial de ovário. Ao contrário de estudos anteriores, no entanto, os autores conseguiram associar causalmente os componentes genéticos da endometriose com alguns tipos de câncer de ovário.

Em termos simples, isso significa que os pesquisadores descobriram que os genes responsáveis pela endometriose estavam impulsionando o desenvolvimento de tecidos que aumentam o risco de desenvolver câncer de ovário, mas não o contrário.

Essa direcionalidade sugere que a endometriose e o câncer epitelial de ovário (EOC) estão biologicamente relacionados e que “o efeito de uma variante genética na endometriose provavelmente causará seu efeito no EOC para as variantes destacadas neste estudo”, segundo os autores.

As regiões genéticas compartilhadas pela endometriose e EOC podem ajudar os especialistas a descobrir quais mecanismos estão impulsionando essa relação causal e quais vias biológicas podem contribuir para o risco.

Essa pesquisa poderia fornecer potenciais alvos de drogas e opções de tratamento para ambas as doenças, interrompendo sua progressão.

No estudo atual, por exemplo, algumas variantes genéticas compartilhadas foram encontradas em regiões conhecidas por hospedar genes responsivos a hormônios.

Isso sugere que a regulação hormonal pode ajudar a bloquear o caminho causal entre a endometriose e um tipo de EOC conhecido como câncer de ovário de células claras (CCOC), que está associado ao crescimento anormal de tecido fora do útero.

Os autores também observam que as vias de adesão celular foram “significativamente enriquecidas” para algumas variações genéticas compartilhadas entre endo e CCOC. Isso sugere que a capacidade das lesões de endometriose aderirem ao tecido pode ser uma parte importante do desenvolvimento da doença para ambas as doenças.

O câncer de ovário endometrióide (ENOC) também foi associado de forma semelhante à endometriose e, em menor grau, ao câncer de ovário seroso de alto grau (HGSOC), que é um dos cânceres humanos mais mortais com poucos biomarcadores preditivos.

Alguns dos marcadores genéticos para endo e EOC identificados no presente estudo também são compartilhados com outras doenças reprodutivas, como síndrome dos ovários policísticos e miomas uterinos.

Os autores, portanto, suspeitam que a “perturbação de vias subjacentes importantes para o desenvolvimento e regulação dos sistemas reprodutivo e endócrino pode predispor as mulheres a uma variedade de doenças”, dependendo de seus fatores de risco genéticos e ambientais.

A endometriose em si não é cancerosa, mas ao longo dos anos, os pesquisadores compararam a forma como as lesões endometriais metastatizam, se espalham, invadem e danificam o tecido com as células cancerígenas.

Alguns estudos de caso mostraram que, em ocasiões muito raras, as lesões endometriais podem se transformar em tecido maligno.

Ainda há muitos caminhos a serem explorados quando se trata de entender a endometriose, mas estudos genéticos como esses podem ajudar os especialistas a reduzir as inúmeras opções à sua frente, levando pesquisas futuras na direção certa.


Publicado em 20/03/2022 06h20

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