Um quasicristal recém-descoberto formado no primeiro teste de bomba atômica

O trinitito vermelho (mostrado) foi formado a partir de areia derretida, fios de cobre e outros detritos após o teste nuclear Trinity. LUCA BINDI E PAUL J. STEINHARDT

Em um instante, a bomba destruiu tudo.

A torre em que estava e os fios de cobre em volta dela: vaporizaram. A areia do deserto abaixo: derreteu.

Após o primeiro teste de uma bomba atômica, em julho de 1945, todos esses detritos se fundiram, deixando o solo do local de teste do Novo México revestido com uma substância vítrea agora chamada trinitita. As altas temperaturas e pressões ajudaram a forjar uma estrutura incomum dentro de um pedaço de trinitito, em um grão do material de apenas 10 micrômetros de diâmetro – um pouco mais longo do que um glóbulo vermelho.

Esse grão contém uma forma rara de matéria chamada quasicristal, nascida no momento em que a era nuclear começou, relataram cientistas em 17 de maio em Proceedings of the National Academy of Sciences.

Cristais normais são feitos de átomos presos em uma rede que se repete em um padrão regular. Os quasicristais têm uma estrutura que é ordenada como um cristal normal, mas que não se repete. Isso significa que os quasicristais podem ter propriedades proibidas para os cristais normais. Descobertos em laboratório na década de 1980, os quasicristais também aparecem na natureza em meteoritos.

As telhas de Penrose (uma mostrada) são um exemplo de uma estrutura que é ordenada, mas não se repete. Os quasicristais são uma versão tridimensional dessa ideia.

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O quasicristal recém-descoberto no local de teste do Novo México é o mais antigo conhecido que foi feito por humanos.

Trinitite leva seu apelido do teste nuclear, denominado Trinity, no qual o material foi criado em abundância. “Você ainda pode comprar muitos no eBay”, diz o geofísico Terry Wallace, co-autor do estudo e diretor emérito do Laboratório Nacional de Los Alamos, no Novo México.

Mas, ele observa, o trinitito que a equipe estudou era uma variedade mais rara, chamada trinitito vermelho. A maior parte do trinitito tem um tom esverdeado, mas o trinitito vermelho contém cobre, restos dos fios que se estendem do solo até a bomba. Os quasicristais tendem a ser encontrados em materiais que sofreram um impacto violento e geralmente envolvem metais. O trinitito vermelho se encaixa em ambos os critérios.

Mas primeiro a equipe precisava encontrar alguns.

“Passei meses procurando por trinitito vermelho por aí”, disse o físico teórico Paul Steinhardt, da Universidade de Princeton. Mas Steinhardt, que é conhecido por viajar até a Sibéria em busca de quasicristais, não se intimidou. Eventualmente, o mineralogista Luca Bindi, da Universidade de Florença, recebeu alguns de um especialista em trinitita, que começou a colaborar com a equipe. Em seguida, o trabalho meticuloso começou, com Bindi “examinando cada partícula microscópica” da amostra trinitita, diz Steinhardt. Finalmente, Bindi extraiu o minúsculo grão. Espalhando raios X por ele, os pesquisadores revelaram que o material tinha um tipo de simetria encontrada apenas em quasicristais.

O novo quasicristal, formado de silício, cobre, cálcio e ferro, é “totalmente novo para a ciência”, diz o mineralogista Chi Ma, da Caltech, que não participou do estudo. “É uma descoberta muito legal e empolgante”, diz ele.

Pesquisas futuras por quasicristais podem examinar outros materiais que sofreram um golpe violento, como crateras de impacto ou fulguritos, estruturas fundidas formadas quando um raio atinge o solo.

O estudo mostra que artefatos do nascimento da era atômica ainda são de interesse científico, diz a cientista de materiais Miriam Hiebert, da Universidade de Maryland em College Park, que analisou materiais de outros momentos cruciais da história nuclear. “Objetos e materiais históricos não são apenas curiosidades em armários de colecionadores, mas podem ter valor científico real”, diz ela.


Publicado em 21/05/2021 12h57

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